No início era a suspeita, o verbo veio muito depois; e a prática filosófica é a implicação de uma coisa na outra. Mas antes de afirmar, é de bom tom perguntar: O que é Razão? E por que Inadequada? Antes de mais nada, é preciso dizer que o Razão Inadequada é um projeto. Como indica a etimologia da palavra, compreendemos o nosso trabalho com a filosofia como algo que nos arremessa para além de nós mesmos. Fazer do pensamento um ofício não é fácil, é como buscar assento em solo movediço, um desafio diário que tanto nos empolga quanto nos consome. Por amor – e às vezes por teimosia -, continuamos a filosofar, apostando que isso pode nos levar a um lugar mais interessante.
1. Razão: palavra que designa relações de proporcionalidade, constância, harmonia, complementaridade. Seja entre ideias, seja entre corpos, nos deparamos com medidas, limites e capacidades que conversam. Neste sentido, pensar significa reunir em relações aquilo que apreendemos do mundo. Isso faz da Razão uma bússola que nos guia por entre o pós-verdade e o pré-conceito, simultaneamente inserindo hesitação nos juízos e certeza nos indícios. A racionalidade é um cuidadoso sistema de ligações descobertas entre partes do universo e é por meio delas que encontramos caminhos.
2. Inadequada: palavra que condensa a estranheza inerente à existência. É isso que nos faz parar para pensar, recusando respostas prontas, abrindo espaço para algo que ainda não sabemos ao certo. Questionar é a postura inadequada por excelência, porque leva o constrangimento ao centro do pretenso saber. Não se faz isso por rebeldia sem causa, mas porque é preciso dar passagem a um desconforto próprio à condição de seres pensantes. Esse anseio se resume em uma pequena pergunta: existe outro caminho? Em outras palavras, existe mais vida nesta vida?
3. Razão Inadequada: nome composto que refere-se à tensão entre harmonia e desarmonia, pergunta e resposta, vida e pensamento. Acreditamos que uma vida mais interessante se faz através do ato de pensar, mas o pensamento não nos espera pronto, a filosofia não é um oásis racional esperando nossa visita. É preciso que haja essa torção que nos leva a pensar ativamente, fazendo da razão algo inadequado. Enquanto as respostas dadas criarem apenas adequação, faremos de tudo, menos filosofar, porque isso só se faz contrariando as tendências que se impõem ao pensamento. Se vivemos coagidos a agir irrefletidamente, então concluímos que pensar é uma espécie de recusa qualificada pela razão em nome de uma vida mais plena de sentido.
Pensamos em nome próprio, mas nunca sozinhos. Estamos acompanhados não apenas de grandes filósofos, mas de muitos amigos. Neste sentido, Razão Inadequada é apenas um nome singular que dá contorno a uma multiplicidade de pensamentos que se faz em comunidade. Se há algo de relevante em nossos textos, conversas e aulas é porque enunciam ideias que existem de forma compartilhada. Somos parte de um projeto coletivo muito maior e mais antigo do que nós mesmos. Renovamos a aposta no pensamento, levando-o adiante. Para onde? Não sabemos, o alvo não existe, até que a flecha seja atirada. Filosofar é compartilhar o desejo de fazer do pensamento algo valioso.