No ano de 2009, foi aprovada na Argentina uma lei para a regularização dos meios de comunicação. A lei prevê um máximo de 24 licenças de canais de TV por assinatura para cada rede transmissora, e, além disso, estes serviços não poderiam alcançar mais de 35% da população. Desde então, uma batalha judicial acontece entre o governo Kirchner e o principal grupo midiático do país, o grupo Clarín, que possui 237 licenças e presta serviços à 58% da população.
O conflito de interesses é claro: o Governo, à favor da lei, pretende acabar com o oligopólio na mídia, pois alega que este prejudica a democracia; enquanto grupos como o Clarín, defendem-se alegando que esta seria uma nova censura aos meios e iria contra a liberdade de expressão.
Quase quatro anos passados e a tal da lei ainda não entrou em vigor, mas, além de muita polêmica, gerou reflexos em vários países sul-americanos. Em 2011, nosso ministro das comunicações, Paulo Bernardo, disse que apresentaria à população brasileira um primeiro projeto para a nova lei geral das comunicações, a chamada “lei dos meios”. Como não nos basta esperar sentados e mudos, pensemos sobre o assunto.
Neste caso, será que regular é o mesmo que censurar? Entender uma ação que vem do Estado via legislação como regularizadora significa que existe uma situação a priori irregular. Desde o período do regime militar, onde foram fechados dezenas de jornais e confiscadas muitas licenças de rádio e TV, há um intenso processo de concentração do poder de comunicação nas mãos de meia dúzia de famílias (A família Civita, Marinho, Saad, etc.), que controlam portanto toda informação que é veiculada nos principais meios brasileiros. Ou seja, neste caso regular é o exato oposto de censurar, pois a irregularidade é resultado exatamente de um processo de censura (na foto, Roberto Marinho, mentor da rede globo, e Figueiredo, então a caminho da presidencia da república durante o regime militar)
O argumento de que a lei vai contra os princípios de liberdade de expressão é válido quando lembramos de períodos de censura e controle da informação por parte do Estado, mas lembremos que a democracia não é apenas feita pelo Estado, assim como o totalitarismo também não. Vivemos uma ditadura dos meios de comunicação. Para Vladmir Safatle, “podemos dizer que leis que impeçam a formação de oligopólios são uma forma da sociedade defender-se da uniformização forçada de opiniões e do silenciamento de perspectivas.” Além disso, para evitar as pressões excessivas do Estado, “há de se pensar ações que impeçam os governos de moldarem as informações a partir de seus interesses”.
A escolha de conteúdo é o primeiro passo quando falamos em comunicação. Passar uma informação adiante passa necessariamente por uma seleção de quais informações são relevantes e quais não são. Supondo que o veículo em questão alcance grande parte da população, os critérios para esta seleção se tornam extremamente relevantes. De que maneira são feitas as decisões do que deve ir ao ar e do que deve ser ignorado? Pois os critérios que vejo na nossa mídia brasileira são: o dinheiro, os benefícios políticos, o jabá, os valores monetariamente relevantes, o entretenimento barato, a crítica tendenciosa (ou inexistente), as ideologias pertinentes (a eles mesmos!) e por aí vai.
É indiscutível a necessidade de garantir que novas ideias tenham espaço para se difundir e de que novas culturas tenham a chance de aflorar. De criar lugares onde a arte e a educação possam tomar o tempo excessivo de publicidade. Veículos onde o global e o comunitário sejam equilibrados, para que a unidimenssionalidade de comportamentos, opiniões e valores seja evitada.
Leia mais:
– Vladmir Safatle em sua coluna na Folha SP
– Resumo feito pelo site da emissora globo sobre o assunto
– Marcus Dantas no portal Carta Maior