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Os acontecimentos da vida assemelham-se às imagens do caleidoscópio, no qual a cada volta vemos algo diferente, mas em verdade temos sempre o mesmo diante dos olhos”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de Vida, p. 233

Depois de averiguar nossa conduta para conosco e com os outros, chega a hora de se compreender qual deve ser a nossa conduta para com o destino do mundo. Para onde estamos indo e quais devem ser nossas atitudes neste caminho? Não podemos nos iludir, há dois mil anos dizemos que evoluímos ou que o apocalipse está chegando! Nunca chegamos em nenhum dos dois. E não seremos os primeiros nem os últimos a dizer estas asneiras.

No fim das contas, a vida humana é, pouco importa o tempo e o lugar, muito parecida, mudam apenas os detalhes, os predicados. Às vezes está mais frio, ou mais calor, ou se tem mais dinheiro, ou menos. Às vezes a economia cresce, em outras temos uma crise global. Mas no essencial ela continua sempre e basicamente a mesma. E provavelmente assim continuará por muito tempo. Se iludem aqueles que acham que é o fim de alguma coisa ou o começo de outra. Com Iphones ou tacapes somos paticamente os mesmos.

Seja qual for a forma que a vida humana assuma, seus elementos são sempre os mesmos. Portanto, naquilo que é essencial, ela é a mesma em toda parte, seja numa cabana, na corte, no mosteiro ou no exército”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de vida, p. 232

O destino do mundo é ele não ter destino certo e determinado. O universo não está nem aí para nós. O futuro nada nos reserva, não se deve confiar na fortuna, pois ao mesmo tempo que ela dá, tira. O acaso não liga para nosso destino, ele embaralha as cartas e as distribui, apenas isso, mas nós somos os jogadores. Das três forças preponderantes, força, sorte e inteligência apenas a última está a nosso favor, ou seja, o artifício, o conhecimento, a sabedoria e a técnica são o melhor de que dispomos para conduzir nossas vidas.

O acaso é um poder maligno, no qual se deve confiar o menos possível”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de vida, p. 233

Devemos observar e aprender, cuidando para que estejamos seguros em nosso posto de observação. O mundo quer nos engolir, nos iludir, nos enganar, ele é muito mais perigoso do que gostaríamos que fosse. Mas sua aparente falta de sentido não quer dizer irregularidade e muito menos imutabilidade, muito pelo contrário! É possível, com reflexão e exame, encontrar suas regras imanentes. O sábio se localiza no meio deste inferno e evita cair nos lagos de fogo ardente.

Ao mesmo tempo, se não estamos indo para lugar nenhum, se o mundo não está melhorando, isso não quer dizer que não estamos mudando o tempo todo. Precisamos atentar para este fato: apenas a mudança é permanente. O homem prudente não se deixa enganar pela aparente estabilidade das coisas e mais, sua sabedoria o leva a prever a possível direção para a qual as coisas se encaminham. Essa sabedoria é muito difícil de conquistar, e geralmente leva anos de trabalho e observação. A mutabilidade das coisas nos ensina a ter prudência, nos incita a nos prepararmos e acautelarmos, para não sermos surpreendidos.

Os sentidos nos mostram apenas o que já foi, mas uma coleção de experiências nos mostra a maneira como as coisas geralmente costumam acontecer. Seguindo o mesmo caminho, o entendimento vai mais longe e mostra o que acontecerá, mesmo que pareça improvável. É aqui que queremos chegar. Porque quanto maior a desgraça, quanto mais improvável, mais difícil se torna de prevê-la e antecipá-la. A intenção é aceitar um mal menor para evitar um mal maior.

Schopenhauer nos ensina que a verdadeira sabedoria de vida é o encontro com os outros e com o mundo onde estejamos preparados para as adversidades, onde prudência e a reflexão nos deem ferramentas para enfrentarmos as dificuldades e, se possível, encontrarmos alguma felicidade. Mas tudo dentro de medidas estreitas, o mundo não permitirá mais que isso. O destino não nos reserva nada além do acaso, devemos nos preparar então. O conhecimento de tudo que é necessário deve nos tranquilizar, ajudar a manter a calma diante dos males da vida. Assim seguiremos calmamente, serenamente, retirando cada pedra do caminho.

Em nenhum evento deve-se irromper com grande júbilo ou grande lamentação”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de vida, p.240

É fácil culpar o destino pelas coisas estúpidas que fazemos, ou pelas coisas que simplesmente acontecem, sem nenhum objetivo último. Mas já sabemos, as coisas acontecem sem se preocuparem com nossa existência ou bem estar, o universo não conspira por nós, nem contra nós, mas sua indiferença nos ameaça. Devemos permanecer calmos em meio ao caos. Schopenhauer ensina que nunca devemos agir por precipitação e impulso, mas ao mesmo tempo nunca hesitar por indecisão! A linha é fina, tênue, e deve ser sempre observada pois as tolices nunca são pagas a prazo, mas descontadas em ato. Por isso a inteligência é uma das principais ferramentas para evitar as dores e os sofrimentos.

Depois da inteligência, a coragem é uma qualidade bastante essencial para nossa felicidade”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de vida, p. 244

Se a primeira nos ajuda a ver mais longe, a segunda nos permite percorrer o caminho que ainda assim é duvidoso. A prudência é instrumento da ousadia e a coragem é essencial para a grandeza de espírito, sem ela estamos perdidos em elucubrações e planos que nunca sairão do papel. Não podemos ceder em face das adversidades que inevitavelmente virão! Enfim, a coragem é virtude essencial para sabedoria de vida, pois sem ela somos apenas covardes recolhidos, fechados.

Enquanto houver a possibilidade de um resultado favorável, não pensemos em fraquejar, mas em resistir”

– Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria de vida, p. 244

Mas cuidado! Coragem pode facilmente degenerar em audácia. A associação de coragem e inteligência será como duas pernas que nos guiarão por este mundo afora. Claro que podemos cair, mas elas são o que de melhor temos à nossa disposição. Vemos como o hedonismo tímido de Schopenhauer possui possibilidades maiores. O destino não poderia ser melhor enfrentado. Se a luta é constante, o campo de batalha é inclemente e a morte é certa, pelo menos seremos encontrados com estas armas na mão. Quem sabe onde elas nos levarão?

Texto da Série:

Sabedoria de Vida

Rafael Trindade

Autor Rafael Trindade

Quero fazer da vida o ofício de esculpir a mim mesmo, traçando um mapa de afetos possíveis.

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