Com a Biopolítica surge um novo personagem conceitual: a população. Se ela não existia antes, não é porque não existiam pessoas, mas simplesmente porque as técnicas de poder não investiam tão profundamente na vida.
Mas o que significa essa naturalidade de população? O que faz que a população, a partir desse momento, seja percebida não a partir da noção jurídico-política de sujeito, mas como um espécie de objeto técnico-político de uma gestão de governo?”
– Foucault, Segurança Território e População, p. 92
Em primeiro lugar: a população não são os súditos, ela não se encaixa no enquadramento jurídico-político, escapa da soberania e não faz parte da disciplina. A população é um corpo em movimento, a pergunta é: como conduzi-la?
Um fenômeno que não se pode mudar como que por decreto, o que não quer dizer entretanto que a população seja uma natureza inacessível e que não seja penetrável, muito pelo contrário”
– Foucault, Segurança Território e População, p. 93
É possível, em primeiro lugar conduzi-la dentro de certos parâmetros de poder policial: é possível colher dados para entender como ela se move. Mas o mais interessante, com o advento do poder pastoral, é compreender que o principal fator de entendimento é como um conjunto de indivíduos que possuem interesses e desejos próprios.
Sendo assim, qual a nova propostas de condução das populações? O desejo! Mobilização do desejo nas mais variadas direções. A população odeia o governo X, o político Y. A população ama o esporte A, despreza o esporte B. A população jamais comprará o item da prateleira de cima, mas certamente comprará o item da prateleira de baixo. A população é como um rio que não para de fluir, mas pode ser canalizado.
Ou seja, o problema não é mais o do dizer não, muito menos o da proibição. O problema é agora o do dizer sim a este desejo, aprender a conduzi-lo dentro da ordem econômica. Por isso, quanto mais se fala de população, menos se fala de soberania. A lei é menos necessária que a incitação do desejo. A disciplina é menos sutil que a manipulação.
Por isso, ao longo do tempo, vemos a disciplina cedendo seu lugar à Biopolítica. A Governamentalidade age como ação sobre a ação, ela abre um campo de suposta liberdade e conduz a conduta de indivíduos supostamente orgulhosos de sua liberdade.
Aqui surge uma oposição: o povo é o indisciplinado, revoltado, irracional. Já a População é aquela que pode ser gestionada, manipulada, conduzida. A oposição povo vs população é importantíssima. O povo é visto como aquele que não obedece e, portanto, apenas atrapalha a população e, como consequência, o governo. O povo é aquele que deve ser dominado para então tornar-se população. Isso enquanto a população é o conjunto de sujeitos dóceis, economicamente racionais, e politicamente incapazes. O povo é o conjunto de sujeitos a se disciplinar, a população é o sujeito gestionável da biopolítica.
O liberalismo cria um corpo que pode ser manipulado segundo seus parâmetros e conforme seus interesses. A população quer ir às compras, a população não quer precisar se preocupar com política (todos são corruptos). Este conjunto de indivíduos se acreditam muito livres para fazer as escolhas que fazem, mas são todos homogeneizados e previsíveis. Com os economistas, vamos ter uma maneira totalmente diferente de conceber a população. Ela se pensa autônoma, coitada, mas ela não passa de massa de manobra perfeita para nossos tempos.
A população é o mais antigo produto da biopolítica. A questão é: ela é dirigida muito bem por politicos e publicitários, etc., mas foi criada? Somos carrascos e vítimas desse instrumento que é mantido por um status quo inquebrável há séculos.
“…a empresa do poder corresponde a resistência ao poder, e talvez aí resida o caráter ambivalente da população. A população é concebida como um recurso, um trunfo, portanto, mas também como elemento atuante.” Escreveu Raffestin em 1980. A população pode ser produzida por organizações, mas ela também se produz. Veja as reações de comunidades que foram deixadas a própria sorte na pandemia.
“…a empresa do poder corresponde a resistência ao poder, e talvez aí resida o caráter ambivalente da população. A população é concebida como um recurso, um trunfo, portanto, mas também como elemento atuante.” Escreveu Raffestin em 1980. A população pode ser produzida por organizações, mas ela também se produz. Veja as reações de comunidades que foram deixadas a própria sorte na pandemia.