A lógica estoica nos mostra que eles pensam muito diferente de Platão e Aristóteles. Para Zenão, Crisipo e seus seguidores, o mais importante é a compreensão dos acontecimentos, ou seja, entender qual é a lógica das modificações. Vimos anteriormente que a lógica é o falar claro e correto daquilo que está em movimento. Ora, se a lógica exprime através das modificações é porque a própria vida do mundo se dá nos Acontecimentos.
Portanto, a diferença entre os aristotélicos e estoicos estará na respectiva importância que cada um dá ao sujeito ou ao predicado. Ou seja, entre o verbo ser (que liga uma substância) e estar (que expressa uma modificação). Por exemplo, para Aristóteles: “Sócrates é um ser vivo, os seres vivos morrem, portanto Sócrates é mortal”. Os estoicos, por outro lado, não estão preocupados com estas classificações. Eles preferem dizer: “Sócrates filosofa na Ágora, Sócrates é acusado, Sócrates se defende das acusações, Sócrates toma a cicuta, e então Sócrates morre”.
Percebem a diferença? Para Aristóteles “a árvore é verde” (substância + acidente). Para os estoicos, “a árvore verdeja” (um sujeito que se modifica), a importância está no acontecimento, no predicado. Tudo para eles anuncia uma relação de modificação, a lógica de um acontecimento. Isso é o que importa, enfatizar ações e atividades, transformando substantivos em verbos, categorias em maneiras de se movimentar.
É muito diferente da nossa maneira habitual de pensar. Podemos dizer que os estoicos estudam como a matéria dos corpos se altera, gerando acontecimentos, como as alterações se entrelaçam, gerando modificações.
Já vimos como a base da lógica se inicia com o empirismo, ou seja, as percepções sensíveis. Desta maneira, podemos dizer que o homem não nasce com ideias inatas (como queria Platão) e a realidade não está disposta em categorias e classificações (como queria Aristóteles).
É tudo uma capacidade de captar a lógica do movimento. É nela que nosso assentimento aumenta e nossa adesão ao mundo se torna mais eficaz. Os estoicos apreendem o mundo através de seus sentidos e da regularidade com que as coisas se modificam.
Por isso a lógica estoica não é como a aristotélica. Esta realiza inferências substanciais, “Sócrates é racional”, “todo homem é mortal”, já a lógica estoica realiza inferências temporais: “há luz, então é dia”; “Acusam Sócrates, então o matam”. Desta maneira é fácil perceber como Aristóteles se concentra na questão da hierarquia, das espécies, dos gêneros, etc. Enquanto os estoicos não classificam nada (tudo para eles é singular), mas encontra o meio das coisas, as maneiras como elas se encontram e se afetam.
Se para Aristóteles, a lógica é estática, e o movimento é apenas uma expressão da potência ao ato, em direção à forma final, nos estoicos vemos que o acontecimento assumirá um papel central, não indo para nenhum lugar em especial, apenas se afirmando nos corpos. O acontecimento é o personagem principal da lógica estoica.
- Proposição coordenada ou conjuntiva:
É dia e está claro
Ninguém segura a pedra e ela está no chão
Há um intolerante no poder e uma ditadura
- Proposição consecutiva:
Soltamos a pedra e ela caiu
O Sol apareceu e houve luz
Colocamos um intolerante no poder e aconteceu uma ditadura
- Proposição disjuntiva:
Ou é dia ou é noite
Ou a pedra está no chão ou alguém a ergue
Ou temos um intolerante no poder ou uma democracia
- Proposição condicional ou hipotética:
Se soltarmos a pedra, ela cairá
Se o sol aparecer, haverá luz
Se um intolerante for colocado no poder, ele implantará uma ditadura
- Proposição causal:
Porque é dia, há luz
Porque soltamos a pedra, ela caiu
Porque colocamos um intolerante no poder, houve uma ditadura
- Proposição comparativa:
É mais dia que noite
A pedra é mais pesada que o ar
Um intolerante é mais inflexível que um democrata
Vemos então o empirismo abrindo caminho para uma percepção racional que permite fazer inferências. O mundo está vivo, em movimento constante, em uma tensão, uma simpatia entre cada parte com o todo. Tudo então se relaciona com tudo intimamente e podemos compreender estas relações.
Ou seja, todas estas relações acontecem dentro de uma lógica clara como a água. E nós podemos apreendê-la. A lógica nos ensina como os corpos se implicam uns com os outros e os estoicos ensinam como esta lógica nos é acessível. Os acontecimentos nos trazem a ordem eterna e necessária dos corpos.
Em suma, podemos ver claramente que o raciocínio estoico sempre se faz com relação aos acontecimentos. A lógica será então a sabedoria do acontecimento, que tira conclusões acertadas dele. Ela compreende o movimento dos corpos, e se utiliza de outros corpos (sons ou escrita) para falar deles. Seu objetivo é um só compreender a modificação que se manifesta dos corpos.
Através da lógica dos acontecimento os estoicos serão capazes de fundar uma maneira racional de viver. Compreender a natureza é abrir caminho para viver nela de maneira correta. Porque viver segundo a razão será ser capaz de misturar-se corretamente aos acontecimentos do universo. Cabe a nós apenas observar e absorver, para melhor nos relacionarmos com eles.
O texto é formidável, o ator mais ainda.
Lindo texto ; bélo acontecimento clareza e síntese conectiva , avante !!!! Abraço