A Filosofia de Epicuro fez muitos inimigos pois nela há um grande número de ideias que vão contra as doutrinas de seu tempo. Criticado pelos céticos, acusado pelos neoplatônicos, depreciados pelos cínicos e em constante embate com seus principais rivais, os estoicos.
Não surpreende Epicuro ser expulso de uma cidade simplesmente por dizer que tudo é composto de átomos, que o mundo não tem uma finalidade pré-determinada, que os deuses não estão nem aí pra gente, que o prazer é bom.
Na filosofia desenvolvida por Epicuro encontra-se um bom número de coisas que não teria agradado à maioria dos gregos. Os deuses epicurianos estão longe da humanidade, e esta não pode nem ofendê-los, nem apaziguá-los mediante suas oferendas e suas orações. Não há sobrevivência pessoal e, consequentemente, o culto aos mortos carece de objeto. O mundo em que vivemos não é o produto de um desígnio divino e filantrópico; faz parte de um universo infinito em que os mundos se formam e se dissolvem em combinações autônomas de átomos num vazio infinito” – Gigandet e Morel, Ler Epicuro e os Epicuristas
Da mesma maneira que ser chamado de espinosista era uma espécie de acusação de materialismo, imoralismo e ateísmo, Epicuro também foi vítima de preconceitos e mal-entendidos deliberados.
Ateus
Os epicuristas não são ateus. Epicuro e Lucrécio, por exemplo, falam com frequência dos deuses. Mas há realmente uma questão muito diferente aqui: eles não ligam para os deuses, simples assim. E mais, os deuses também não se preocupam conosco.
Eles existem, mas são perfeitos, então, porque se abalariam com qualquer coisa que acontece na Terra? Sua perfeição impede que tenham qualquer tipo de preocupação ou sentimentos humanos, demasiadamente humanos.
Se eles não se preocupam com a gente, nós também não precisamos nos preocupar com eles. Eles estão lá e nós aqui. Nada do que fizéssemos os tiraria de seu equilíbrio perfeito. E eles não farão nada por nós também.
Negar os deuses? Não, muito pior, afirmar sua indiferença! Por isso os epicuristas foram acusados de ateísmo. Negam a criação (por que os deuses criariam qualquer coisa? Nada lhes falta). E, como se não bastasse, negam a eternidade da alma, porque tudo são átomos se reunindo e se desfazendo, desde a eternidade.
Apolíticos
Os epicuristas vivem isolados, negam a política e a polis, pois bem, outra mentira acusatória! Os epicuristas apenas acreditam que o principal não está na vida política. Mas daí a dizer que os epicuristas são apolíticos é exagero. Aliás, Epicuro nunca proibiu seus discípulos de participarem da vida política. Muitos deles inclusive frequentavam o jardim apenas depois de suas atividades diárias, sejam quais fossem.
Os epicuristas apenas trocavam a polis pela comunidade, a ágora pelo Jardim Davam mais valor ao último. Trocavam as autoridades pela amizade. Se os Deus são indiferentes, os reis também devem tornar-se.
Um recuo da praça para o Jardim, concebido como refúgio (mas não como um claustro ou esconderijo). Lá era possível viver livremente, entre amigos, sem déspota, numa forma de comunidade, composta de seguidores da mensagem emancipadora ensinada pelo mestre amorosamente venerado” – João Quartim de Moraes, Epicuro e as luzes da Ética
Viver sem hierarquia! Teria coisa melhor? A política está toda estragada, é a luta do poder pelo poder. A corrupção dos valores, a tentação dos puros e justos. A política destrói a paz de espírito e não pode ser praticada como modo de vida.
Cabe se envolver com política apenas o estritamente necessário, mas de resto, deve-se procurar a paz e a tranquilidade da vida afastada e horizontal.
Não filósofos
Os reis se cercavam de sábios para tomar suas decisões: neoplatônicos, estoicos, peripatéticos e até mesmo cínicos. Mas a filosofia epicurista nunca frequentou estes lugares, esteve sempre em segundo plano. Poderíamos dizer que ela é uma filosofia menor? Talvez, não levando em conta o tom depreciativo. Se fazem filosofia, não é gritando, para todos ouvirem, nem sussurrando no ouvido dos poderosos, preferem uma conversa com amigos e interessados..
Claro que as acusações vinham principalmente pelo fato dos epicuristas não respeitarem a filosofia oficial de Platão ou Aristóteles. A filosofia deve ensinar a viver e ser feliz nesta vida, não a ficar falando de mundo das ideias e criando utopias. O hedonismo escorregava do mundo das ideias e das categorias para traçar uma linha de fuga. Outro motivo era o fato de não filosofarem em público, procurando grandes plateias. Pra quê? A filosofia não é para o povo, é pra quem quer ouvir. Não se filosofa pra quem passa apressado na rua, mas para quem procura uma cura para seu sofrimento.
Não se encontrará nos epicuristas a menor tentação pelo poder, pela fama e pelo reconhecimento. Eles não buscam deuses, não bajulam os poderosos e ignoram os filósofos da ágora. Eles não escrevem sobre Repúblicas, como Platão, não instruem líderes, como Aristóteles, não aconselham ditadores, como os Estoicos. O epicurismo sempre esteve à margem, este pode ser considerado seu grande objetivo e trunfo. A alegria interna, que não precisa se mostrar espalhafatosamente.
Belo trabalho Rafael e de bom gosto, bravo!
Muito bom! Epicuro sempre pregou a paz interior e ter prazer com coisas simples.
Epicureus e epicuristas, seria a mesma coisa? Desculpe minha ignorância
“A política destrói a paz de espírito e não pode ser praticada como modo de vida.”
Está me parece bem uma posição apolítica. Tendo a pensar que a filosifia epicurista era sim apolítica e até com certos traços antipolítica.