Marco Aurélio é uma das figuras mais importantes do estoicismo. O filósofo imperador, nascido em 121 d.C., foi discípulo de Apolônio e Rústico, sendo assim considerado o sucessor direto de Epiteto.
Pouco após a morte de seus mestres e sua coroação em 160 d.C, Marco Aurélio se vê jogado num mundo de guerras, intrigas, traições e pestes. Passando a maior parte de sua vida no front de batalha, longe de casa, enfrentando inúmeras crises políticas e com poucas pessoas com quem contar, qual caminho o Imperador Estoico escolhe? A serenidade da Filosofia.
Meditações
Nascem assim as Meditações, um conjunto de pensamentos que Marco Aurélio se esforça para escrever todas as noites, para reavivar os ensinamentos estoicos em seu espírito.
O valor literário das Meditações de Marco Aurélio é, com razão, célebre. O vigor das fórmulas, a vivacidade das expressões, a severidade do tom retêm a atenção do leitor a cada página” – Pierre Hadot, Exercícios Espirituais e Filosofia Antiga
Meditações é uma das poucas obras estoicas que se salvou, mas foi por muito pouco. Como Marco Aurélio não tinha a intenção de publicá-la, ela provavelmente ficou guardada depois de sua morte e foi encontrada por algum parente. Por muito tempo desconhecida pelo grande público e estudiosos, ela foi “descoberta” empoeirada na biblioteca do Vaticano apenas por volta de 1559.
Como eram escritos pessoais, muito comuns naquela época, o livro nem tinha nome. Podia ser classificada como Hypomnemata, que do grego significa algo como “reflexões pessoais” ou “notas para mim”.
Mas as Meditações de Marco Aurélio não constituem um livro comum, elas são um exercício espiritual. Ou seja, elas servem para diariamente lembrar o imperador dos fundamentos do estoicismo: Física, Lógica e Ética. Os dogmas do estoicismo são constantemente reescritos para serem mantidos vivos na mente e de fácil acesso em momentos de dificuldade.
Lendo as meditações, assiste-se a um esforço incessantemente renovado para formular, sempre de novo modo, de maneira impactante, sob uma forma literária rebuscada, os mesmos dogmas e as mesmas regras de vida. Para Marco Aurélio, não se trata de expor um sistema, nem mesmo de tomar notas para se relembrar, mas de modificar, quando sente necessidade, seu discurso interior a fim de recolocar a si mesmo numa certa disposição” – Pierre Hadot, Exercícios Espirituais e Filosofia Antiga
Ou seja, Marco Aurélio escreve as meditações com um único objetivo: reavivar a força do estoicismo em seu espírito, em suas três áreas: Física, Lógica e Ética.
Três Disciplinas
As três Disciplinas estoicas estão relacionadas às três capacidades da alma: Julgar, Desejar e Agir.
Se a alma é capaz de três atividades, então cabe a nós nos disciplinarmos para cumprir bem estas três capacidades.
- Se a Alma é capaz de Julgar, então a Disciplina do Assentimento é o Exercício da Verdade. Mais do que falar de Lógica, a Disciplina do assentimento nos ensina a viver a lógica, colocá-la em prática, reavaliar de modo crítico nossa maneira de organizar nossos pensamentos. Nos torna capazes, então, de realizar nossa natureza racional. Sua Virtude é a Moderação.
- Se a Alma e capaz de Desejar, então a Disciplina do Desejo está relacionada ao que esperamos do Cosmos. O objetivo é Disciplinar-se para viver a Física, viver no mundo como ele se mostra para nós. Ensina a desejar como a natureza deseja e aceitar seus desígnios. Deste modo, aprendemos a ver o mundo de uma perspectiva maior. Está associada à Virtude da Coragem.
- Se a Alma é capaz de agir, então a Disciplina da Ação está relacionada à capacidade de agir para o bem de nossa comunidade e da humanidade como um todo. Mais do que falar do que é certo, ela nos ensina a fazer o que é certo. Ensina quais as ações convenientes e próprias para os seres humanos se realizarem como seres sociais. Sua virtude é a Justiça.
A natureza racional segue bem a vida que lhe é própria: se, no que concerne às representações, ela não dá seu assentimento nem ao que é falso, nem ao que é obscuro; se ela dirige suas tendências somente em direção às ações que servem à comunidade humana; se ela só tem desejo e aversão pelo que depende de nós enquanto acolhe com alegria tudo o que lhe é dado em partilha pela natureza universal” – Marco Aurélio, Meditações IX, 7
Este é, diz Marco Aurélio, junto com todos os estoicos que o precederam, o caminho para o Florescimento Humano. A capacidade de distinguir o que é verdade e mentira, de desejar aquilo que nos é realmente bom e de agir apropriadamente com os outros.