“E, se forem necessárias biografias, que não sejam aquelas que têm por refrão: ‘Fulano de tal e seu tempo’, mas as que deveriam ter por título: ‘um lutador contra seu tempo”
Friedrich Nietzsche
Da utilidade da história para a vida
“E, se forem necessárias biografias, que não sejam aquelas que têm por refrão: ‘Fulano de tal e seu tempo’, mas as que deveriam ter por título: ‘um lutador contra seu tempo”
Da utilidade da história para a vida
No dia 15 de outubro de 1844, em um pequeno vilarejo da Prússia, nasce Friedrich Wilhelm Nietzsche, primeiro de três filhos de um pastor luterano. Este veio a falecer quando Nietzsche tinha apenas dois anos, seu pequeno irmão mais novo morre seis meses depois. Por razões monetárias, sua família mudou-se então para Naumburgo.
Na escola, Nietzsche ganhou o apelido de “o pastorzinho”, porque era avesso ao convívio social e se dedicava muito aos estudos. Desde essa época, o pequeno Nietzsche mostrava uma vontade de auto-domínio muito além da de seus amigos, este severidade consigo mesmo irá estender-se por toda sua vida. Como tinha grande admiração por poesia e música, começou então a escrever e compor.
Ao terminar seus estudos secundários, por influência de sua família, inscreve-se na Universidade de Bonn para cursar teologia, mas, a contragosto de sua mãe, decide largar os estudos para formar-se em filologia. Depois de concluir sua formação, devido aos seu grande conhecimento e respeito de seus superiores, é convidado a lecionar filologia na Universidade de Basileia, conta então com apenas 24 anos.
Nietzsche conheceu a obra de Schopenhauer por acaso, encontrado seus livros na prateleira de uma pequena livraria. Foi muito influenciado por seu pensamento. Também foi amigo pessoal de Richard Wagner, por quem tinha grande admiração. Em 1871 lança sua primeira obra, O Nascimento da Tragédia, ainda sob influência da música de Wagner e da filosofia pessimista de Schopenhauer, com os quais depois virá a romper.
Sua vida como jovem professor universitário passa sem grandes percalços. Dizem que era um bom professor, apesar de falar muito baixo, e que improvisava suas aulas com graciosidade a partir de anotações que fazia depois de dedicadas pesquisas. Em 1879, as dores de cabeça pioram devido à péssima vista de Nietzsche. Estas dores o acompanhavam desde 1873 e o levaram a afastar-se várias vezes da escrita; ler e escrever era uma tarefa cada vez mais penosa. O filósofo pede demissão à Universidade de Basileia para passar o resto de sua vida como filósofo errante e com um ordenado de 4 mil francos pelos serviços prestados à comunidade.
Por dez anos, não passa mais que seis meses em parte alguma. Suas viagens constantes, pautadas pela busca de climas que lhe permitam melhores condições de saúde. Costuma passar os invernos no sul e os verões no norte. Este estilo de vida nômade o leva a conhecer Sils Maria, uma pequena vila à qual voltará anualmente até 1888. É lá que terá o que chamou de seu pensamento mais abissal: o Eterno Retorno.
Com 37 anos, por meio de um amigo em comum, Nietzsche conhece Lou Salomé, inteligentíssima e linda jovem russa, na época com 21 anos. Ele se apaixona e pede-a em casamento. Ela recusa, por três vezes. Esta desilusão amorosa terá grande impacto na vida de Nietzsche, ele rompe com seu amigo e com Lou, também com sua família¹, que odiava a “atrevida russinha”. Nesta época, estava escrevendo Gaia Ciência, onde a frase que posteriormente o tornou famoso (Deus está morto) é formulada pela primeira vez.
É uma época de grande produção, e ainda que desesperado, tem forças para escrever o que reconheceu como seu livro mais importante, Assim Falou Zaratustra, mas já encontra dificuldade em achar quem publique e leia suas obras. Mesmo assim, continua seus estudos e seu modo de vida errante. Naumburgo, Leipzig, Basiléia, Gênova, Nice, Veneza, Turim. Costuma morar em pensões simples, e sua regrada rotina consiste basicamente em ler e escrever suas idéias pela manhã, almoçar, longas caminhadas no período da tarde, jantar e trabalhar mais um pouco antes de dormir, isto quando sua doença o permite. Seus hábitos comedidos não permitem bebidas alcoólicas nem café. Dedica-se a seus filósofos favoritos: Epicuro, Montaigne, Espinosa, Heráclito; também procura estudar a fundo a influência cultural do platonismo e do cristianismo. Aprecia ler romances de grandes escritores como Balzac, Goethe, Stendhal e Dostoiévski.
Em 1885, apesar de todas as revisões e remanejamentos de seus textos, Nietzsche termina por publicar Além do Bem e do Mal, livro inédito de aforismos que expõe em maiores detalhes sua obra anterior, que tinha um caráter mais poético e fictício. Como não obtém a resposta que esperava por suas publicações, escreve Genealogia da Moral, cujo subtítulo é adendo a Para Além do Bem e do Mal. Mas o silêncio é quase absoluto, as pessoas parecem não entendê-lo.
Seus últimos escritos são elaborados durante o ano de 1888. O filósofo, de alguma forma, esteve sempre doente: dores de cabeça, vômitos, problemas estomacais, náuseas, violentas enxaquecas e insônias. Os médicos não sabem diagnosticar qual a origem dos sintomas. Nietzsche fez da doença uma condição, um estímulo para seu pensamento, filosofar é triunfar, superar-se, pensar e conviver com o sofrimento. A dor constante leva Nietzsche a formular sua fórmula para a grandeza do homem: Amor-Fati.
Turim tem ótimos efeitos para a saúde de Nietzsche, é lá que vive seus últimos momentos de lucidez². Já em 1888 Nietzsche mandava cartas assinadas como Jesus, César, Dionísio. Em 3 de janeiro de 1889 Nietzsche é recolhido da rua criando, segundo relatos, um escândalo público. A lenda diz que ele caiu em uma praça acometido de uma forte tensão psíquica após abraçar um cavalo para defendê-lo dos golpes de um cocheiro.
Sua família é aconselhada a interná-lo. Passa um ano na clínica psiquiátrica de Basileia, perto de sua família. Já em estado de apatia, passa aos cuidados da mãe e quando esta morre, vive com a irmã até falecer com 54 anos em agosto de 1900. Antes mesmo de sua morte, a irmã de Nietzsche trabalhava com sua obra, reunindo seus escritos falsificando uma suposta obra “Vontade de Poder”, dando margem a interpretações anti-semitas. Serão necessários anos até que a obra de Nietzsche finalmente se afaste desta ideologia.
“Ouçam-me! Pois eu sou tal e tal. Sobretudo não me confundam”
Ecce Homo
Existem muitos livros de introdução a Nietzsche, muitos mesmo… a maioria é uma porcaria ou simplesmente não dá conta da força do pensamento do bigodudo. Mas outros são capazes de, em poucas palavras, expressar aquilo de mais importante que o filósofo tinha para dizer e ainda gerar a sede de se aprofundar em seu pensamento, estes são os mais nos admiram!
Muitos preferem começar por um livro de introdução, principalmente quando o autor é complicado e cheio de obras e fases diferentes. Faz sentido, nós temos uma pequena lista de livros introdutórios:
O livrinho “Nietzsche“, escrito por Oswaldo Giacoia (publifolha) é uma ótima primeira leitura! Curto, extremamente simples, falando um pouco de cada fase do autor e de seus principais conceitos. Giacoia é professor e um mestre da didática! Seus livros são extremamente claros. Talvez seja a melhor primeira leitura possível.
Outra boa introdução é do nosso amigo Amauri Ferreira, “Introdução à filosofia de Nietzsche” (Yellow Cat Books). Amauri tem uma escrita mais agressiva, com pitadas de interpretações deleuzeanas. Sua introdução é mais meticulosa, indo direto aos conceitos. É um livro rápido de ler, mas que fornece muito conteúdo, abrindo caminho para outras leituras.
Os escritor francês Michel Onfray é um nietzschiano de primeira. Um bom exemplo disso é que todos os seus livros, sem exceção, começam com uma citação do filósofo alemão. Em sua juventude, Onfray escreveu “A sabedoria Trágica – sobre o bom uso de Nietzsche” (Autêntica). Uma ótima introdução pois traz cinco desconstruções operadas pela filosofia de Nietzsche e logo em seguida cinco proposições, mostrando que o filósofo do martelo não age apenas destruindo ídolos!
Um livrinho considerado de iniciante, mas não não sabemos exatamente em que medida, é “Nietzsche” (edições70), de Gilles Deleuze. O filósofo francês possui interpretações muito particulares da obra de Nietzsche, por isso consideramos que mesmo como uma obra introdutória deve ser lida com muito cuidado. É possível se arriscar, e para aqueles que gostam de Deleuze é imprescindível.
Mas podemos dizer que o melhor livro de introdução que nós já lemos foi “Nietzsche: Civilização e Cultura” (Martins Fontes), escrito por Carlos A. R. de Moura. O livro foi feito a partir das aulas de graduação que Carlos Alberto ofereceu na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo. Realmente parece que, durante a leitura, tem alguém conversando com você. Este é o livro de introdução mais longo de nossa lista e oferece uma perspectiva histórica e conceitual passando por várias obras de Nietzsche, com diversas citações, e mostrando o peso de sua filosofia para o pensamento moderno.
Para os que preferem começar com uma boa biografia, nós sugerimos a de Rudiger Safranski, “Nietzsche – Biografia de uma Tragédia” (Geração Editorial). Safranski escreveu as biografias de Schopenhauer e Heidegger, então podemos dizer que ele sabe do que está falando. Apesar da leitura leve, sua escrita é cheia de dados históricos, trechos de cartas, mas o mais importante, o pensamento do filósofo é exposto conforme a biografia avança, então entendemos o quanto uma vida se reflete em pensamento e vice-versa.
Para consultas esporádicas nós utilizamos o “Dicionário Nietzsche“, organizados pelo Grupo de Estudos Nietzsche, na USP. Muito bom, muito claro e conciso, e vem também com seleção de aforismos sobre os temas, não deixando quase nada de fora.
Muito bem, livros introdutórios são bons, mas nunca devemos nos intimidar pela obra de um filósofo! No fim das contas é só pular de cabeça, abrir um livro do autor e começa a ler, não entendeu? Tudo bem, pega outro! Não há nada de errado nisso, não são apenas estudantes de filosofia que têm permissão para ler um filósofo (por enquanto). Nós, reles mortais, também podemos. Certo, mas por onde começar?
Já leu os livros introdutórios? Já leu os livros do próprio autor? Que tal se aprofundar mais em algum tema específico agora? Nietzsche é um autor consagrado em vários temas e por isso resolvemos colocar outros livros na lista para interesses específicos.
Bom, parece que já temos uma lista satisfatória, outras indicações seriam apenas uma maneira de demonstrar falsa erudição. Aqui já temos o bastante para centenas de reflexões, estudos, críticas e dúvidas. Vale dizer também que a maioria dos livros virou conteúdo de nossos textos espalhados pelo site, então uma coisa se reflete na outra. Não teríamos um boa lista se não tivéssemos lido tudo isso e não teríamos nos interessado em ler tudo isso sem a vontade de escrever sobre e aplicar o máximo possível em nosso cotidiano.
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